Parte das características mais marcantes da cozinha Thai está no talento em aceitar e incorporar novos ingredientes e técnicas de outras culturas e países à sua cozinha sem que sua identidade seja comprometida. Ao ponto de tudo ser tão bem assimilado que parece que sempre fizeram parte da vida das pessoas. Por isso, se olharmos sem muita atenção, nem percebemos as influências de ingredientes da Índia, Portugal e China.
Mas a história da comida da Tailândia que nos traz ao que conhecemos hoje começa muito antes. Remete à era Sukhothai (1238-1438), quando começa também a história do reino da Tailândia, que perdura até os dias atuais.
Foi nesse período que os Thais se libertaram do domínio Khmer e se organizaram na região de Sukhothai. Foi ali que nasceu o alfabeto Thai, época em que o pilão já era usado no preparo dos alimentos.
Na era seguinte – Ayutthaya (1351 – 1767) o reino de Sião se torna uma importante potência regional, tanto em tamanho quanto em riqueza. Nesse mesmo período (século XV – XVI), no ocidente, as grandes navegações levaram os europeus ao novo mundo. E foram essas navegações que trouxeram os portugueses como os primeiros europeus a terem contato com o Reino de Sião, trazendo consigo ingredientes que hoje são o cerne da cozinha tailandesa, como tomate, batata, berinjela, cana de açúcar e claro, as pimentas.
Depois, com a expansão das rotas comerciais, vieram os indianos, os persas e os chineses, e com eles vieram novos hábitos e ingredientes. O gapi (pasta de camarão) e o nam pla (molho de peixe) vieram com os chineses, enquanto que o uso do leite de coco nas preparações salgadas veio dos indianos e seguem essenciais na cozinha Thai.
Segundo o chef Mcdang em seu livro “Principles of Thai Cookery”, nessa época também foram introduzidos os ovos de galinha na alimentação local. Até então, apenas ovos de pato eram consumidos, pois as galinhas eram raras e reservadas às rinhas.
O fim do império Ayutthaya se dá em torno de 1767, quando os Burmeses saqueiam a região. Sobe ao trono o Rei Taksin, que após importantes vitórias militares, incorpora Chiang Mai e o Reino Lanna ao Império de Sião.
Só que ele é assassinado após um golpe, e sobe ao poder seu ex comandante, que passa a ser conhecido como Rama I e marca a era conhecida como Rattanakosin, que perdura até hoje (o rei atual é o Rama X).
Grande parte do desenvolvimento da era Rattanakosin foi resultado da expansão do comércio com outros povos. E com isso a região viu aumentando a presença de estrangeiros, sobretudo chineses, que foram se estabelecendo na região sudeste do país, e também em Bangkok. Com os chineses vieram os métodos de cocção na wok – frituras e salteados – além do uso do noodle de arroz. Com eles veio o hábito de comer também a carne do pato, pois apenas os ovos da ave eram consumidos até então.
De todos os países da região, a Tailândia foi o único que não foi colonizado. O reino, que até 1939 era chamado de Sião, se beneficiou do fato de os europeus estarem todos brigando entre eles por porções territoriais pela região do Sudeste Asiático. Mesmo assim, acabou tendo que abrir mão de territórios no Laos, Camboja e no que hoje é a Malásia, em benefício dos colonizadores franceses e britânicos,de modo a garantir sua independência.
Talvez por isso a Tailândia seja o único país da região que conseguiu incorporar os novos ingredientes trazidos pelos europeus à sua cozinha sem que mudanças culturais drásticas ocorressem (como no Laos, Camboja e Vietnã, que passaram a aderir aos hábitos de consumo dos colonizadores franceses, consumo de baguete, manteiga e maionese, por exemplo).
Foi só no início do século XX que um livro de cozinha tailandesa se tornou referência ao reunir uma enorme quantidade de receitas em uma enciclopédia. Mae Kruaa Huaa Bpaa foi lançada em cinco volumes e era direcionada às elites. Antes disso, era tradição na Tailândia a edição dos livros fúnebres: livretos que contavam a vida de um falecido, que incluía bons momentos de sua vida e também as receitas de seus pratos favoritos, como uma tentativa de manter a pessoa viva na memória de todos. Hoje, tais livretos são tratados como relíquias e podem valer milhares de dólares, assim como a primeira edição do Mae Kruaa Huaa Bpaa.
O Pad Thai foi elevado a prato nacional em 1940, depois de campanha nacionalista do primeiro ministro Phibunsongkhram, que estimulava o consumo de comida tailandesa e apreciação dos produtos nacionais, em um momento que a colônia chinesa era crescente como mão de obra, desenvolvimento econômico e invasão gastronômica, por ser também um país de DNA culinário marcante.
Hoje, toda a riqueza e diversidade de sabores e texturas que são características da cozinha Thai trazem um pouco de cada uma dessas influências que acabaram se fundindo às tradições tailandesas, tornando essa gastronomia única e especial.
Fontes:
Principles os Thai Cookery – by Chef Mcdang – Editora Mcdang Dot Com Ltd 2010
Thailand: The Cookbook – by Jean Pierre Gabriel – Editora Phaidon
Food Culture in Sohttps://amzn.to/3sjU6uKutheast Asia – Série Food Culture around the world – Penny Van Esterik Editora Greenwood Press 2008
Eat Drink Asia: The nationalist politics behind Pad Thai. Podcast do South China Morning Post, por Alkira Reinfrank Bernice Chan Yang Yang, publicado em 27/04/2019 Link